segunda-feira, 17 de março de 2008

Olhar que adivinha

De todas as adivinhações do amor nenhuma é mais funda que a dos olhares que se atam e parecem não poder desprender. Namorados assim o fazem, paqueras, aranhas, serpentes, aves, répteis, mamíferos, amantes, amigos, esposos. O olhar aprisiona-se no mistério do outro. E fala de encontros não verbais, essenciais. Economiza tempo. Avança ou retrocede milênios na adivinhação do próximo.
O que será, este olhar? Susto? Sustar é paralisar. Há uma paralisia quando o amor é pressentido. Susto mas adivinhação.
Adivinhação mas procura. No olhar de quem se adivinha amando, paralelo à felicidade transmite-se procura, indagação,ânsia de descobrir que se veio ao mundo para resgatar as incompletudes daqueles com quem se relacionará profundamente, se os encontrar e souber que encontrou .
Procura mas encontro. No olhar que se cruza e paralisa cheio de significações encontra-se a instância deslumbrante na qual o ser se descobre aceito, querido e perdoado.
Encontro mas impossibilidade. Tudo o que vai sendo proibido, velado, guardado, adiado, faz-se verdade no momento da hipnose do olhar que se atrai sem explicação.
Impossibilidade mas permissão. As barreiras, medos, a polidez, recatos, as resistências que surgirão (reação que não se explica mas se tem) deixam de existir no instante do olhar que devasse a verdade funda. A entrega pré/sentida.
Permissão mas mergulho na sombra. O demônio que mora dentro, a criança, o anjo, o pecado, o perdão, a esperança, todos os mecanismos secretos, guardados, não sabidos, raro assumidos,jazem fugidios e perceptíveis no olhar que se defronta.
Não me refiro ao olhar apaixonado. Falo de algo além, o olhar que paralisa o outro. Que se apavora de adivinhar-se, possivelmente feliz, e se descobre em profundidade e espanto no poço do outro, no fundo do qual mora uma certeza nunca antes confirmada. Nada o detém, limita ou qualifica. Contém a pluralidade constitutiva da vida. Explode na hora do amor ou no instante da morte. Seus compromissos são com o fundo, o longe, o eterno, o imponderável, o denso, o lindo, a paz, a tragédia ou a glória. Sua relação é com as certezas que a razão nunca terá, mas a emoção, a intuição e o sentimento (que vão além), de há muito as conhecem. Este olhar existe quando e onde sempre existiu. E existirá, a despeito de nós.


Artur Távola


Nada como uma conversa cara à cara para poder encarar a pessoa e a partir do seu olhar enxergar se há verdade em suas palavras... Como dizem "os olhos são as janelas da alma"!!

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